Alguém me falara que Valdomiro morava em Aracaju, no bairro São Carlos, na saída da cidade. Fui até lá, perguntei por ele em cada mercearia. Ninguém sabia me informar do acólito de Luiz Couro, que herdara seu terreiro e suas funções, se bem que sem o mesmo carisma do velho macumbeiro. O São Carlos é bem maior do que pensara e resolvi retornar depois com mais tempo e uma estratégia de busca.
Foi quando precisei ir a Itabaiana, ao lançamento do livro “Vendedor de Sereias” de Robério Santos, no dia 12 de maio último. E cheguei muito cedo para a festa. Havia tempo disponível e toquei para Campo do Brito, onde mantivera contato com esse povo misterioso, trinta anos atrás, quando comprei a fazenda Sariema (de Luiz Couro) que depois rebatizei como Saracura e que, posteriormente, vendi a Joaquim Macedo, do Colégio Purificação.
Bati na porta de uma casa na praça da saída para Macambira. Fora ali que conversara com Valdomiro pela última vez. Uma mulher amistosa me informou que o meu amigo, há seis anos, mudara-se para o céu. Mas um filho morava ali perto. E começou a gritar, chamando alguém que passava de moto. Era Cuscus, o tal filho de Valdomiro. Ele me encaminhou a sua mãe, dona Terezinha, na estrada da Ribeira, na saída para o Ceilão. Ela teria as informações que eu queria, garantiu-me.
Encontrei-a sentada na calçada, à porta de sua casa. Disse-me que, uma aprendiz de macumbeira levara tudo que se relacionava ao culto e sumira no mundo. Não possuía mais nada. Só se Roque, filho de Luiz Couro, pudesse me ajudar. E deu-me o endereço, no bairro Bom Jardim, depois da Usina, no outro lado da cidade.
Tive alguma dificuldade, mas Pedro, um cidadão que encontrei no caminho, ofereceu-se para me levar lá. A casa de Roque (na Rua José Teles de Meireles) estava fechada e tinha uma placa indicando ser um Centro Espírita. Talvez o filho continuasse os trabalhos do pai, pensei. Uma vizinha se apressou em me indicar a casa ao lado, em construção. Roque estava lá, cercado de meninos pequenos, frutos de uma nova união mais ou menos estável. Era um senhor de setenta anos, baixinho, solícito. E foi me respondendo o que lhe perguntava, visando o meu objetivo de escrever um livrinho de versos falando do macumbeiro Luiz Couro, por quem tive sempre admiração.
Soube da existência de outros filhos de Luiz Couro (irmãos de Roque), ainda vivos: Josefa – que mora em Aracaju, perto da Catedral; José – que mora no Rio Grande do Sul, vizinho ao Paraguai; e Paulo – que mora em Manaus ou em uma cidade perto.
Luiz Couro (Luiz Tavares de Andrade) nasceu em 1917, no povoado Lagoa, em Campo do Brito, onde hoje é o Posto de Maim, na entrada da cidade, na beira da pista para Itabaiana. Faleceu em 26/09/1990. Era filho de Manoel Couro, que tinha esse sobrenome porque vendia os couros dos muitos bodes que matava no seu açougue pé-de-pau.
Ainda rapazinho, Luiz Couro foi morar na Bahia (Salvador), onde exerceu a atividade de verdureiro, vendendo nas feiras e de porta em porta. Lá manteve contato com os terreiros, tendo conhecido os grandes nomes do candomblé. Retornou muito doente e foi acolhido por seu tio Alexandre, um famoso nagô em Laranjeiras. Deve ter aprendido com ele mais um pouco sobre as crenças discriminadas.
Logo que se curou, arrumou casamento e começaram a nascer os filhos. Foi quando resolveu montar um terreiro (que chamou de “Centro Amor e Bondade dados por Jesus”), para sobreviver. Inicialmente, trabalhou com mesa branca. Além do Brito, teve terreiros em Aracaju, Itabaiana, Pinhão e São Cristovão.
Quando morava na fazenda Sariema (aquela que depois virou Saracura) construiu um hospital, onde internava enfermos, dava banhos de ervas santas, rezava rezas fortes, fazia malemas. Muitos chegavam quase à morte, e retornaram curados para suas cidades.
Roque falou das pessoas que estavam sempre ajudando o santo, como Valdomiro (que o substituiu após a morte), Dona Bidu (já falecida), Zefa de João Preto,Maria de Pedro Leôncio e Rita de Zé Couro.
Sobre Sultão da Mata, o intrigante caboclo índio, contou-me que tem ainda a imagem, de mais ou menos um metro de altura, na capelinha de São Domingos, que está fechada. Guarda lá também outras imagens sagradas, como Nossa Senhora da Conceição, Santo Onofre, São Domingos, São Jorge, Santa Bárbara, Iemanjá e Nossa Senhora das Candeias. De dois em dois meses ele vai, com algumas antigas devotas, espanar a poeira, limpar o mato ao redor.
Convidou-me para acompanhá-los no próximo domingo. Mas não deu, dessa vez.
“São Domingos ainda hoje
Tem saudades do seu “santo”
Das procissões pelas ruas
Que eram motivo de espanto
Seu Luiz paramentado
Os andores adornados
E o povo entoando cantos”
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